Entrada de blog por Catarina Canelas - Dezembro 17, 2025


NÃO À PRORROGAÇÃO DE ALMARAZ. PROLONGAR AS NUCLEARES? NÃO, OBRIGADO.

“Apagão” foi escolhida palavra do ano em Portugal em 2025. Uma palavra que reflete o impacto que esta falha no fornecimento de eletricidade teve na vida das pessoas no país. Um acontecimento histórico que trouxe à superfície a incerteza e a angústia sentidas pela população perante uma falha do sistema energético.

Uma falha que também abriu uma janela de oportunidade. Um momento em que as pessoas pararam para falar entre si, ouvir rádio à porta de casa e reviveram momentos de entreajuda semelhantes às que marcaram o período da pandemia da covid. É precisamente sobre estas duas dimensões que te quero falar neste texto. O sistema energético e a solidariedade.

E o que têm estas duas coisas a ver com a energia nuclear? Já lá vamos.

Na Extremadura funciona há mais de 40 anos uma central nuclear situada no concelho de Almaraz, na província de Cáceres, a apenas 130 quilómetros da fronteira com Portugal. Foi concebida para operar durante 40 anos e já ultrapassou esse limite em mais de quatro anos. Ao longo da sua vida, acumulou centenas de paragens por falhas técnicas não programadas.

Tal como acontece com todas as centrais nucleares durante a sua operação, acumulam-se toneladas de combustível altamente radioativo, que permanecerá ativo durante milhares de anos.

Apesar de estar previsto que esta central encerrasse o primeiro dos seus dois reatores em 2027 e o segundo também no mesmo ano,  recentemente têm sido dados passos que indicam a intenção de prolongar a sua vida útil até 2030 ou mais.

Prolongar a vida de Almaraz, como defendem os seus proprietários e alguns partidos políticos, é um ato de irresponsabilidade política e técnica. Contraria a legislação em vigor e compromete os planos de transição para um modelo energético verdadeiramente limpo e autónomo, colocando em risco as populações de Portugal e de Espanha, assim como o meio ambiente.

A indústria nuclear está a pressionar para manter um modelo energético obsoleto, caro, sujo e perigoso.

É perigoso porque cada mês adicional de funcionamento, aumenta o risco de acidente nuclear numa instalação envelhecida.

É sujo porque gera resíduos sem solução definitiva, que permanecerão ativos durante milhares de anos com um custo ambiental incalculável.

É caro porque o custo de produção da energia nuclear é muito superior ao das energias renováveis, mesmo quando estas incluem sistemas de armazenamento.

É obsoleto porque não previne nem responde a emergências, como ficou claro no apagão que afetou Portugal e Espanha, em abril de 2025. Durante esse episódio ficou demonstrado que as centrais nucleares não conseguem regular o sistema perante perturbações nem arrancar ou parar com rapidez, face à variabilidade da procura.

Além disso, esta tecnologia bloqueia o desenvolvimento de um sistema energético baseado em energias limpas locais e seguras, ocupando uma parte do mix energético que poderia ser assegurada por renováveis.

Prolongar a vida da central envia um sinal negativo ao setor das energias renováveis e atrasa o encerramento das restantes centrais nucleares em Espanha, um processo que tem de ser faseado. Isto aumenta o risco de toda a população da Península Ibérica estar exposta a um possível acidente nuclear e compromete o necessário processo de transição energética renovável em toda a região.

Apesar de Portugal não ter centrais nucleares, Almaraz representa uma ameaça real para o país. Por isso ao longo da história consolidou-se um forte movimento antinuclear, que junta organizações ambientais, coletivos de esquerda de direita e cidadãos de diferentes setores sociais e económicos.

Sob o enquadramento do Movimento Ibérico Antinuclear, mais de 30 coletivos portugueses têm lutado durante anos para sensibilizar a opinião pública e os governos dos dois países para os riscos da energia nuclear. Em particular para os perigos associados à central de Almaraz e ao projeto entretanto travado de exploração de urânio, em Retortillo, junto à fronteira com Portugal.

Um exemplo claro da mesma solidariedade que emergiu no dia do apagão.

Neste contexto de agravamento da ameaça nuclear, a Greenpeace Espanha a Ecologistas en Acción da Extremadura e a Associação para a Defesa da Natureza e dos Recursos da Extremadura (ADENEX) lançaram no passado dia 27 de novembro a campanha “Prolongar as nucleares? Não obrigado”. Durante o evento de apresentação da campanha, realizado em Badajoz, foi apresentado o seguinte manifesto bem como um formulário de adesão destinado a coletivos interessados.

O perigo de um acidente nuclear é invisível mas existe. Em Espanha há exemplos próximos como o acidente de Palomares em 1966 (Andaluzia), o da Cidade Universitária de Madrid em 1977 ou o acidente de Vandellòs (Catalunha), em 1989. Nenhum destes teve consequências diretas em território português mas a ameaça mantém se.

A partir da Greenpeace Portugal queremos dar eco a esta luta que partilhamos, por razões evidentes. Uma das muitas problemáticas ecossociais que tornam necessária a colaboração entre a Greenpeace Espanha e a recentemente criada equipa portuguesa. Porque a dependência dos combustíveis fósseis agrava a crise climática. Porque a energia do século XXI pode e deve ser renovável, distribuída,  limpa e democrática. Porque prolongar a vida da energia nuclear retira-nos autonomia, justiça e segurança.

É tempo de mudar.

Por isso dizemos: 

Prolongar as nucleares? Não obrigado.

Prolongar a vida de Almaraz? Não obrigado.

Luís Berraquero Diaz, Coordenador de Mobilização da Greenpeace na Andaluzia e Doutorado em Meio Ambiente e Sociedade

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